Castelo de Vidro

Neste tempo chuvoso, misturado com frio, dias propícios à congeminação da Primavera, primordiais para o seu adorno e vitalidade; também é tempo de privamento e introspecção, como deve ser a Quaresma, preparação da festa pascal, seja em poucos minutos de recolhimento ou oração, seja através duma leitura, aproveitemos todas as oportunidades para a alcançar uma maior espiritualidade…
Foi através duma história de vida, qual notável memória de resiliência e redenção, tal como a atribulação infligida a Jesus, na sua via íngreme e sagrada até ao alto magnânimo da cruz onde nos redimiu, que eu granjeei atingir essa conversão...

Na verdade, quando abri o livro, de título tão sugestivo, não pensei ficar tão empolgado com o desbravar da narrativa, nada mais que o relato pessoal de Jeannette Walls, uma reputada jornalista americana, que nos revela os segredos da sua infância, num ambiente familiar sui generis, que tem de tão disfuncional como de extraordinário e autêntico..

O seu pai encantador e entusiasta, que transmite aos filhos a paixão pela vida, através da sua visão astuta dos acontecimentos e da sua sabedoria… também sofre da dependência do álcool, que o torna destrutivo e imprevisível, com dificuldades para gerir financeiramente o lar.
A sua mãe, pintora orgulhosa da sua arte, de espírito livre e alienada daquela vida desconcertante, também ela sem saber lidar com a convenção da parentalidade.

Páginas adentro, vai-nos narrando o itinerário intermitente, as peripécias vividas pelos diversos lugares, sobrevivendo como podem, aprendendo a cuidar-se mutuamente, adaptando-se àquela divertida e dura realidade. Ela e os irmãos vão crescendo a ler livros intermináveis, fantasiando sobre o castelo de vidro que seu pai fala em construir com eles…
Até que, divididos entre o feitiço da inocência e a pobreza extremada, planeiam a sua fuga para uma vida melhor em Nova York. Os pais decidem seguir-lhes o rasto mas adotam uma vida de indigência.

Enfim, uma comovente história de uma família que ama mas que também abandona, que é leal e, ao mesmo tempo, dececiona. Talvez como qualquer família, mesmo de aparente normalidade, que vão vivenciando as atribulações da responsabilidade parental, do enorme desafio que representa o crescimento harmonioso e sadio duma casa, tentando manter a conduta à salvaguarda de imprevistos e contrariedades, mesmo que para isso (ou precisamente por isso!), tenhamos que recorrer à ajuda de Deus!

"Quando não nos contava todas as coisas extraordinárias que já tinha feito, o pai falava-nos de todas as coisas maravilhosas que ia fazer. Como construir o Castelo de vidro. Todas as competências de engenharia e o génio matemático do meu pai estavam a convergir num projeto especial: uma casa enorme que ele ia construir no deserto para nós vivermos. Teria telhado de vidro, grossas paredes de vidro e até escadas de vidro. O Castelo de vidro teria paineis solares para aquecimento, arrefecimento e para todos os eletrodomésticos... 
Quando ele terminasse o Prospetor e ficássemos ricos, poderia começar a trabalhar no nosso Castelo de vidro."

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